A grande lacuna entre pais e filhos está na comunicação, no diálogo, tão necessário para manter saudáveis as relações, qualquer que sejam elas. A maior parte dos pais comete o grande equívoco de acreditar que o diálogo só precisa acontecer no ápice dos problemas, encontrando, na maior parte das vezes, apenas o silêncio de seus filhos. Falo isso de um patamar de experiência própria, tendo sido eu, hoje com 29 anos e mãe de um mocinho de nove, uma adolescente problemática e rebelde, que apesar da educação excelente recebida, viveu por muitos anos à sombra dessa lacuna.
Hoje, no plano de educação estabelecido para o meu filho, o diálogo está na base do todo, no centro das atenções. Conversamos sobre tudo, desde as travessuras na escola, os imensos detalhes do cotidiano, até as questões mais complexas, como a relação humano-corpo, humano-humano. Além de aprender muito com ele, me sinto muito mais pronta para resolver os problemas quando eles aparecem, porque problemáticas não surgem do acaso: percorrem caminhos suntuosos, até desabar no mar da dúvida que atormenta e causa angústia.
Não acredito na irreversibilidade das coisas, ou melhor, procuro não acreditar. Assim, me assumo uma otimista quase ingênua da humanidade. E grande parte desse acreditar, sem dúvidas, vem do fato de ser mãe. Porque sempre que penso em desistir – e não são poucas as vezes que esse pensamento chega sorrateiro – é ele quem vislumbro à frente. Portanto, resolvi escrever sobre isso, porque todos somos filhos e alguns de nós, pais. E não me venham com o velho papo de que “se conselho fosse bom seria vendido”, porque essa desculpa estritamente egoísta e capitalista nunca me foi muito digesta e se queremos de fato um mundo melhor para nós e para aqueles que nos precederá, precisamos sim, botar pra fora o que sabemos sobre o mundo, para somadas as experiências, buscarmos as melhores soluções, seja qual for o contexto.
Sendo assim, convoco todos a pensar sobre isso. Um bom papo em casa diminui consideravelmente a necessidade de uma busca posterior aos profissionais especializados para isso. Longe de mim acabar com o ganha pão dos psicólogos, analistas e afins; quero antes alertar é para a não-necessidade para tantas buscas por terapias, muitas vezes solicitadas por aqueles que não têm a quem recorrer perto de si. São alguns e não todos os casos, obviamente. Mas são muitos. Atualmente, podemos perceber, se observarmos um pouquinho, que paralelo ao boom tecnológico que vivemos, onde estamos cada vez mais inseridos em novas redes de sociabilidade, isolamo-nos em mundos construídos para nossos egos e permanecemos à espreita do todo. Ora, será que toda essa solidão pulsante não tem um precedente? E será tão difícil assim compreender que esse precedente pode estar lá atrás, nos confins de nossa infância e/ou juventude?
Crianças não nascem sabendo se comunicar. Isso soa óbvio, mas não o é, na prática. Nós, pais sobretudo, precisamos aprender a aprender. E isso não é lá muito fácil… Porque enquanto enfrentamos o mundo apenas como filhos, vivemos nossas problemáticas nesse grau hereditário, pois somos “as vítimas” enquanto os pais são “os culpados”. Invertendo o jogo, muitas máquinas quase pifam. Mas a observação constante do comportamento e a leitura possível de fazer das atitudes e contrários, nos levam a um conhecimento sensacional sobre eles e sobre nós mesmos. Quando uma criança mente, por exemplo, uma coisa tão típica na primeira infância, o que podemos fazer além de repreender? Conversamos. Elas não entendem, muitas vezes, suas próprias atitudes e nós somos os mediadores dessa história, pois estamos num processo constante de plantação e colheita com relação a eles e ao mundo. Precisamos ir e voltar com informações que parecem pequenas num primeiro instante, mas que serão extremamente pertinentes quando eles passarem a ver o mundo sem ter a nós como filtros. E engana-se, como eu me enganei tantas vezes, que esse olhar solitário deles para o mundo chega numa idade mais avançada apenas; ela acontece desde sempre, e se potencializa muito cedo. E a gente que tenha jogo de cintura para manter o equilíbrio em todas as negociações!
E esse é o gostoso da empreitada. Se vc, mamãe e papai, estabelecem como hábito o diálogo, ele será sempre o movimento precursor de todas as situações futuras, mesmo na inevitável ‘aborrecência’, que graças a Tupã, passamos todos nós, pois ela é essencial para os binóculos que seremos no futuro. Sejamos mais atentos aos nossos rebentos, nós, seres inverídicos do século XXI. Vamos acabar de uma vez com esse escasso paradigma que insiste em repercutir, onde as crianças não têm vontades. Elas têm e muitas! E nós, temos uma compreensão melhor sobre os limites cabíveis, as vias de organização dessas vontades; Temos a experiência para indicar os caminhos, a paciência para escutar as repetidas versões, o carinho para viabilizarmos os sonhos, segurando os pezinhos lá no chão. Sem maiores divagações espiritualistas, é bom acreditar que fomos escolhidos por elas, afinal, para guiar melhor os seus caminhos. Portanto, vamos fazer isso com a verdade da palavra expressa, olho no olho, ouvidos atentos e força para o imprevisível que sempre vem.